No rosto senil de Miraak despontava o mais singelo dos sentimentos, ele reconhecia naquele momento grandeza no homem a sua frente, força que conhecera em poucos indivíduos, aquele era um rapaz que havia nascido para liderar, mas não apenas no sentido estrito da palavra, ele deveria guiar os homens para um local de grandeza, do qual haviam decaído a muito. Um sorriso, um oferecimento de gratidão a aquele homem a tanto apagado. Generosidade além do comum, ele não iria retribuir não daquela maneira. Em seus olhos as estrelas ardiam e queimavam, elas condensavam massivas fontes de energia, um reflexo do universo acima, poderosas e grandiosas, alheias ao sofrimento mundano, o relógio nunca parava, e os fios que sustentavam a própria vida não eram nada perante o fôlego resplandecente e renovador que o cosmo carregava, incutindo na própria existência, um saber surreal, e ao mesmo tempo deprimente, não importava o destino daqueles que viviam abaixo de seus céus, nada cessaria a roda do destino. Miraak sabia bem disso, presenciara aquilo centenas de milhares de vezes, e finalmente conhecera seu fim, aquele era apenas um resquício, um fio de realidade que restava, sozinho, em um oceano infinito de idéias esquecidas. Mas ele não estava só, e nem era apenas quem era. Skar-ke precisava entender, ele mesmo havia dado as coordenadas, um ato que julgava instintivo do jovem, era a vontade de seu ser, e ele revelaria todas as portas cerradas, naquele momento.
Sem mais uma palavra Miraak se tornava uma sombra, um alguém distante, desvanecendo em meio ao mar temporal que circundava o local, não havia oque ser dito, eram apenas meias palavras, e ele um homem que muito queria dizer. Logo Skar-ke se via sozinho na imensidão deserta do fluxo temporal, distintamente de antes, ele não sentia uma força movendo sua mão e carregando-o em direção ao que quer que fosse, ele estava completamente liberto, mas a vastidão não podia ser caminhada, sua lonjura, ventos cortantes e armadilhas ciclicas, tornavam fácil para que a alma se perdesse em meio a seus halls. Mas havia algo capaz de guiá-lo em segurança rumo ao seu próximo destino, seu coração, a vontade e perseverança de Ke o fazia percorrer a trilha certa. No entanto era inevitável... com um deslize momentaneo ele caia, não em uma armadilha, mas em uma fissura do tempo, uma das muitas que ele mais cedo havia criado ao forjar coordenadas com suas palavras. Aquela o fazia cair por uma brecha no solo, estreita e escura, no entanto quente como uma fornalha, existia algo ali, um momento crucial na história do mundo, e ele testemunharia em poucos instantes. Após 4 minutos de queda algo batera em sua cabeça com força, provavelmente uma rocha, oque o impedia de perceber que não mais caia envolto a terra, agora o céu o circundava oscilando entre as nuvens, a terra se aproximava a cada instante, uma ilha estranha, forjada a ferro. Uma aura pairava ali, firme e orgulhosa, observando tudo e a todos. A velocidade do ar raspando por seus ouvidos aumentava, mal conseguia abrir seus olhos tão intenso era o movimento. Mas logo tudo cessava, um negrume tomava conta de sua vista, e quando reabria seus olhos percebia que estava observando o chão, a vista ainda meio turva por conta da viagem forçada, ao seu redor uma imensa escadaria se estendia ao longe, seu topo tão alto que a vista não era capaz de alcançar, forçosamente ele se desequilibrava e ameaçava cair, sendo amparado por uma mão que se posicionava em suas costas. No entanto o momento era diferente de antes, Skar-ke não estava dentro do jovem, ele o via de fora, mas conseguia ler sua mente e ver por seus olhos em alguns momentos. Uma clara mudança do momento em que fora induzido a visão no tempo.
- Parece que esses Qunari venderam bebida demais para nosso pequeno amiguinho - Dizia uma voz feminina atrás de si - Um garotinho tão novo passando mal pela ressaca, que visão tristonha.
Uma moça de cabelos verde água se aproximava dele pela sua esquerda, ela era a dona da voz, de inicio não a reconhecia bem, mas logo percebera a deslumbrante princesa Aveline Organny a sua frente, a cada dia que se passava sua paixão platônica pela princesa só aumentava, e esconder tais sentimentos ficava ainda mais dificil, mas quaisquer chances que ele poderia pensar em ter abandonava no mesmo instante, um rapaz de 16 anos recém saído da grande academia não teria chance alguma com uma mulher daquelas. Mesmo assim não o impedia de admirar sua beleza real, neta mais nova do Grande Mestre Oaran, Aveline não tinha puxado nada de seu avô, diferente da carranca velha no lugar de rosto como sempre zombava Rosenkreuz a jovem tinha uma face afilada, com lábios carnudos e olhos violetas. Suas curvas também o atraiam de maneira exagerada, com seios fartos, sonho comum de todo adolescente, pernas fortes e carnudas, moldadas a um perfume doce de pétalas de rosa amanhecidas, a princesa era uma imagem prazerosa por si só. Apesar de movida por um humor negro ela se mostrava muito preocupada com seu bem estar, oque o encantava ainda mais.
- Tome cuidado Ryuuhou, prometi ao seu primo Lelouch que o protegeria, não gostaria que esses degraus quebrassem a minha promessa. O orvalho da manhã fez com que a pedra ficasse lisa, prossigam com cautela, esse lugar parece feito para espantar forasteiros.
Outra voz inconfundível, Kanon Shindoragon, mais conhecido como Grifen o Sombrio, ou também Lorde Kira; nomes que ele jamais entendera, uma vez de Kanon era um homem gentil e prestativo, não importava quantas vezes tentasse imaginá-lo assassinando friamente um grupo de templarianos, era incapaz de gerar uma cena convincente o bastante, a timidez fazia bem seu serviço o impedindo de questioná-lo a respeito, ao mesmo tempo que com tal aviso nada mais fazia do que dar um leve aceno de cabeça. Kanon era enorme perto dele, um metro e noventa centímetros de altura, forte e musculoso, habilidoso, famoso e disputante do cargo de mais forte aprendiz de Oaran. Nada com que ele pudesse se comparar, possuia um metro e cinquenta e sete centímetros de altura, uma estatura baixissima até mesmo para sua idade, e desconfiava que não cresceria mais, um rosto afeminado como seus irmãos gostavam de esculachá-lo, e cabelos longos e negros até o pescoço, ele não era oque a maioria teria em mente para um herói. No entanto isso nunca o impedira de lutar com todo seu afinco, tendo se formado sete anos mais cedo entre os feiticeiros, e ocupando cargo de comandante dentro das forças de seu clã.
- Não temos tempo sobrando, subam rapidamente - Clamava uma voz ao longe, parecia vir do topo da escadaria - O Arishok não irá esperar para sempre, e depois de toda a demora para nos atender não pretendo fazer com que ele nos odeie mais do que já odeia - A voz era forte e brava - Pelo amor dos deuses Kanon carregue esse garoto até aqui antes que ele desabe escada abaixo!
Aegeon Juilaik. Um nome, muitos significados, para Ryuuhou mais do que para a maioria, desde a partida de Tulan, o enorme guerreiro vice líder do clã Juilaik havia desdenhado dele. "Esse não é o lugar para um pivete recém cagado" como adorava dizer. Para ele um babaca sem fim, mas deviam muito ao grandalhão, experiente na guerra, e principalmente temido entre os Qunari, Aegeon tinha sido a porta de entrada "segura" a ilha de Par Vollen, e por mais que fizesse da sua vida uma zombaria constante, não poupara esforços para garantir a segurança tanto dele como da princesa e de Kanon. A escadaria ainda estava longe do fim no entanto.
- Como ele chegou lá em cima tão rápido Kanon? Não entendo esse homem - Ele começava a desconfiar que a princesa estava gamada em Lord Kira, desde o inicio da viagem, ela parecia de uma intimidade além da comum para com ele - Estou tão cansada. Uff.
A princesa ameaçara sentar, apenas para ver Lord Kira seguir em frente sem ela, sem sombra de dúvidas parecia não ter escutado uma só palavra que proferira. Fingindo como se nada tivesse ocorrido ela o seguia, suas bochechas muito vermelhas. Não havia escolha, Ryuuhou fazia o mesmo, quanto mais protelasse mais demoraria para encontrar com Aegeon. Finalmente alcançava o fim, já havia alguns minutos que os demais haviam chegado ao topo.
- Parashaara, humanos... oque traz os jassrath tão cedo ao palácio de vossa alteza?
- Temos uma reunião com o Arishol, e não temos tempo para perder com você Saarebas, agora nos dê passagem - Dizia Lorde Aegeon
- Não sei se será possivel jassrath'is, não me lembro de ser avisado de reunião alguma.
Saarebas, a pior parte de toda a viagem. Servo maior e conselheiro do Arishok, o Qunari deformado por batalhas contra os feiticeiros mostrava total desacato a qualquer um que não fosse pertencente a sua crença. Em Qunlat, Jassrath significava, grande comedor de merda, literalmente, quando Lord Kira soube daquilo, instruiu a todos que não compartilhassem tal conhecimento com Lord Aegeon, que era conhecido por ter matado Qunaris por simplesmente terem falado palavras para ele. A missão começara em Tulan, ele havia sido escalado por seu primo Lelouch Lamperouge para servir de apoio numa reunião de paz com os Qunaris. A guerra com os Qunari se alastrava por muitos meses, e nesse periodo ambos os lados haviam sofrido grandes baixas, preocupado com isso o Grande Mestre, após receber uma denuncia de que o Arishok reunia uma força de guerra ainda maior em sua capital Par Vollen, ordenara a seu discipulo mais "Coeso" Lord Kira para servir a embaixatriz dos feiticeiros, Lady Aveline. Quase que imediatamente o clã Juilaik havia acusado Oaran de conspirar por suas costas, oque o forçou a nomear o vice líder do clã Aegeon Organny para a missão. Depois de uma viagem de oito semanas de navio haviam atracado na ilha. Mas apesar do esperado, não haviam recepções, mesmo tendo todas as cartas alcançado seu destino. Com muita persuasão no estilo "Juilaik" como Aveline dissera, haviam conseguido comida e um lugar para ficar, no entanto mesmo após treze dias ali o Arishok se recusava a esperar. Até que conseguiram marcar uma reunião. Agora Saarebas tentava envia-los embora, Ryuuhou não sabia se aquilo era mera provocação, ou se o Arishok havia realmente voltado atrás.
- Não tenho tempo para brincadeiras seu rato imundo - Aegeon avançava na direção de Saarebas, ele não parecia pretender agredi-lo mas com um trombão forte passava diretamente pelo Qunari, que revoltado revidava lançando contra a cabeça do homem um pedregulho - Seu.... um do seu povo a menos não vai fazer diferença.
- Venha... venha Basra, estou louco para abrir seu crânio de Dathrasi!
Com um salto Aegeon erguia seu punho se lançando contra Saarebas, mas a velocidade do Qunari não podia ser subestimada, ele se esquivava pelo lado e tentava com uma de suas longas unhas envenenadas acertar o rosto do feiticeiro. As garras no entanto iam de encontro a poderosa armadura dourada símbolo do alto escalão dos Feiticeiros, que ele usava, ricocheteando e fazendo com que a mão de Saarebas fosse quebrada no processo. Aegeon tinha sangue em seus olhos e com um chute lançava o Qunari contra um dos pilares da entrada do Grande Palácio. Mas ele não estava derrotado ainda, falando rapidamente em uma língua irreconhecível o ser enviava uma onda negra contra o Juilaik, ele se esquivava, mas era exatamente oque Saarebas deseja, a onda acertava diversos pedregulhos espalhados por seu impacto que então se uniam na forma de um imenso elemental de pedra. Sem perceber a movimentação Aegeon era pego em cheio por um golpe da criação de Saarebas. Ainda mais fulo da vida, ele começava a reunir uma massa enorme de energia em sua mão. Lady Aveline parecia preocupada, enquanto guardas se aglomeravam com as armas em punho. Aegeon estava pronto para explodir o lugar levando Saarebas para o inferno, no entanto a luta não continuava. Um baque enorme era ouvido, junto de uma ordem ribombante:
- CHEGA! - Lorde Kira olhava para ambos os combatentes com um ar sério, tão sério como nunca vira antes, seu semblante calmo e comportado havia sumido completamente - Saarebas, seu dever não é questionar as decisões de seu Arishok, ele nos garantiu uma reunião nessa hora e lugar, se os Qunari ainda seguem seus próprios códigos de Honra e moral nos leve até ele.
- Não tente me ensinar sobre o Qun humano...
- Se não quer ouvir isso de mim então cumpra com seus deveres de uma vez - Saarebas parecia enjoado por ter que fazer oque Lorde Kira lhe dizia, mas estava em uma posição onde se discordasse não apenas desonraria a si mesmo, como a toda sua raça. Ao ver aquilo Aegeon começava a debochar do Qunari, isso até receber um olhar repreendedor de Lorde Kira, que estendia em sua garganta seu longo tridente - Mais um pio Aegeon, mais uma baderna, e não serão os Qunari que cortarão sua cabeça. Atrapalhe nossa missão e você e os seus irmãos vão se arrepender de terem se metido nesta missão. Eu Fui Claro?
Claramente contrariado, Lorde Aegeon assentia com a cabeça. Os portões do Grande Palácio se abriam, ao fundo um enorme Qunari se sentava, possuia mais de dois metros e meio de altura, muito maior que qualquer um de seus servos. "O Arishok" sussurrava Ryuuhou, Lady Aveline parecia concordar com ele.
- Ebala Maraas. Ben'dar Salit-asit? - Dizia o Arishok, seu tradutor, claramente não um Qunari, talvez um membro do povo da floresta repetia suas palavras na lingua comum - Auto lá. Quem vem aos halls da contemplação?
Lady Aveline tomava a frente, a embaixatriz de todo um povo, linda e maravilhosamente bem vestida, era tudo com que Ryuuhou conseguia pensar naquele momento, ele no entanto se perguntava como ela falaria com o Arishok, ele pelo menos não conhecia os costumes daquele povo, oque deveria fazer? Não sabia.
- Arishokost. Maaras shokra. Anaan esaam Qun - Dizia a princesa com uma pronúncia digna de um Qunari nato, Kanon traduzia para ele as palavras, com sutileza ele sussurrava quase que sem mover sua boca "Paz, Arishok. Não há nada pelo que lutar. A vitória esta no Qun" - Saudações sou Lady Aveline Organny a Segunda, filha de Lorde Sravos Organny, neta de Oaran Organny, e embaixatriz do Império Feiticeiro. Venho em paz em nome de meu povo estender a vossa majestade um tratado, uma tentativa de selar o fim da guerra que queima nossas duas raças...
- Saatareth barek - O Arishok dizia como se desdenhasse de Aveline- Shok ebasit hissra. Meraad astaarit, meraad itwasit, aban aqun. Maraas shokra. Teth a anaan esaam Qun - O tradutor se apressava para entender as palavras - Besteiras humanas - Ele dizia - Lutas são uma ilusão. As marés sobem, as marés baixam, mas o mar é imutável. Não há nada para lutar. Como você disse, a vitória está no Qun.
- E mesmo assim inocentes morrem todos os dias em batalhas, vossa alteza ainda acha que estao lutando contra nada? Trago a paz senhor, humildemente em nome de todos cujo sangue foi derramado, lhe imploramos que as chamas da guerra se apaguem.
- Nehraa aqun ebra kata Arvaarad. Ataash varin kata. Lutar com humanos é lutar com nada. No fim existe a glória -Traduzia o membro do povo
- No fim existe apenas a morte, a minha e a sua alteza - Uma comoção se remexia entre os Qunari que ouviam a conversa - A dos seus filhos e a dos meus irmão, nossos povos se aniquilarão, e afundaram em sangue e podridão.
- Maraas imekari - Dessa vez o Arishok dispensava seu tradutor - Uma criança balindo sem sentido. Vocês estão sozinhos, não vê basalit-an?
- Com todo o respeito Antaam. Mas isso irá nos consumir, imploro para que ouça a razão.
- Asit tal-eb. Ataash Qunari!
A princesa olhava para seus companheiros com uma cara de impotência como se soubesse que havia falhado. Skar-ke sentia nesse momento uma conexão mais poderosa com Ryuuhou, ele podia sentir sua essencia, e a vontade de agir. Aquele era o momento se nada fosse feito os Qunari iriam continuar com suas maquinações, e eventualmente poderiam destruir tudo pelo que os pais e avós deles haviam construido. Aegeon parecia perdido em meio a reunião. E kanon se mantinha inerte, ele nada faria Ryuuhou sabia, aquela era a missão da princesa. Ele TINHA que tomar uma decisão, ajudá-la, ou deixar que a princesa lidasse com o Arishok. E no centro da decisão estava Skar-ke, aquele que via tudo se desenrolar, fosse qualquer sua decisão ele seria o agente mobilizador daquele momento, a voz de Ryuuhou e a dele soariam em unissono.